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Lance Notícias | 15/12/2024 15:57

15/12/2024 15:57

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Quilombo do Morro do Boi: fundadora conta sobre origens e futuro da comunidade quilombola

Para conhecer o local, a reportagem chegou durante uma tarde abafada – e, para contar a história, Sueli Leodoro, que também é filha da matriarca Esmeralda Leodoro, abriu a casa

Entre o morro que divide o concreto entre Itapema e Balneário Camboriú, se esconde – no cume, entre a mata, a comunidade quilombola Morro do Boi, que leva o nome da paisagem que a abriga. Ali, há gerações, se formou o único quilombo da região da Costa Esmeralda. Para conhecer o local, a reportagem chegou durante uma tarde abafada – e, para contar a história, Sueli Leodoro, que também é filha da matriarca Esmeralda Leodoro, abriu a casa.

Sorridente, Dona Sueli caminha pela estrada principal do Quilombo. Foto: Bruno Gallas

O encontro aconteceu ao fim da estrada de terra batida que leva à comunidade principal. O asfaltamento é uma demanda antiga da região – comentado por um dos moradores e também pelo professor Willian Meister, que conduziu a equipe do Lance ao local. 

“Com o reconhecimento da terra, agora, a expectativa é de que todas essas demandas sejam federalizadas”, explica.

A entrada da residência da fundadora é ampla e arborizada – com citronelas crescendo entre as árvores para espantar mosquitos. Logo na entrada, dezenas de bonecas Abayomi estavam dispostas em uma mesa de madeira.

Sueli explica que a tradição vem dos navios negreiros e é apenas uma das muitas outras que permanecem vivas na cultura quilombola espalhada pelo Brasil.

“As mães, dentro dos navios, faziam essas bonecas para que as crianças não chorassem e não fossem notadas pelos portugueses”, explica.

O quilombo foi titularizado em novembro de 2023. Com isso, é assegurada a regularização fundiária e os direitos da população quilombola. 

À reportagem do Lance, ela conta com carinho sobre o lugar onde nasceu. Foto: Bruno Gallas

Segundo Sueli, o processo foi suado e contou com movimentação de toda a comunidade, assim como aliados externos.

“Eu, minha mãe, meus irmãos, nos reunimos e decidimos fazer o quilombo. Como quilombo, começamos o processo em 2007, com uma amiga minha, Anelisa Schlickmann, que estudava direito na Univali”, diz.

O primeiro passo foi o autorreconhecimento. Todos, no quilombo, são uma grande família – literalmente. Parte do processo de autorreconhecimento surge das relações cosanguíneas entre uma ou mais famílias que se estabeleceram, há gerações, no local quilombola.

Abayomi feito por Dona Sueli – tradição que remonta aos navios negreiros

“Normalmente, nos quilombos, a família casa entre si. Então fomos fazer a pesquisa. A Anelisa e o grupo do Incra foram à Catedral para buscar documentos. Antes, todos os registros em Floripa. Aí acharam o nome dos nossos tataravôs, e foi indo. Através da pesquisa, mandamos ao Incra e ao Instituto Palmares, tudo isso em 2017”, diz.

“Em 2019, fizemos a certificação de que era um quilombo. E aí foi feita a demarcação e os demais processos dentro da comunidade. Como minha mãe está acamada, quando saiu a titulação, pegamos ela, levamos para frente da placa para aproveitar o festerê que estava rolando. Tudo que fazemos é do aval dela. Eu sou a mais metida”, continua.

Outra parte importante é a autossuficiência. Ali, também, tudo é de todos – e a produção orgânica de alimentos para consumo próprio ou para comércio. A tradição é antiga, explica Sueli, citando o exemplo dos pais.

“Eles saíam daqui para a praia de Balneário carregando produtos para vender. Mandioca, palmito, limão, laranja. Todo mundo comprava. Principalmente em época de eleição”.

Foto: Bruno Gallas

Ainda, a presença da comunidade na formação das cidades partiu das mãos e das criações dos quilombolas, que sempre se fizeram presentes em festas e eventos culturais.

“Na época do [ex-prefeito] Periquito (MDB) tinha mais festas. A gente participava junto do festival do camarão; com artesanato, com alimento. Tínhamos um bom presidente da fundação cultural, que era o Belluzzo”.

Como a área é compreendida pelo município de Balneário Camboriú, a expectativa com a entrada da prefeita-eleita Juliana Pavan é de um estreitamento de laços novamente entre o município e os quilombolas.

“Vamos esperar. Ela colocou no plano de governo uma atenção à comunidade quilombola. Estamos há muito tempo aguardando o asfalto aqui. Vamos esperar”.

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